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Artigos de Filosofia


Platão e Aristóteles
O Discípulo não supera o Mestre, o complementa

Luciene Félix
Professora de Filosofia e Mitologia Greco-Romana da ESDC
mitologia@esdc.com.br

 

Impossível discorrer sobre a singularidade do pensamento de Aristóteles (384 – 324a.C.) sem contextualizá-lo diante de seu Mestre, Platão (Arístocles: 428-347a.C.), que por sua vez fora discípulo de Sócrates e, o primeiro a elaborar uma teoria sobre a Alma. Para esclarecer o que distingue esses dois Pensadores, ponderemos sobre as dicotomias, as duplas de opostos/complementares que constatamos através dos sentidos (dia e noite; macho e fêmea) ou do Espírito (O Bem e o Mal). Dicotômica também será a linha teórica filosófica adotada por esses Filósofos de truz.

Em 387a.C., Platão fundou o que pode ser considerada a primeira instituição de ensino superior do mundo ocidental, a Academia de Atenas (dedicada à deusa da Sabedoria e da Justiça). No 1º nível (até os 16 anos), treinamento científico: matemática, ginástica, astronomia, música e geometria: na entrada uma placa avisava: “Ageometretos mé eisito” (sem geometria, não entre). Já no 2º nível (dos 16 aos 30 anos), os alunos aprendiam ética, a virtude e a política para, no 3º nível (dos 30 aos 50 anos), aprender a dialética e tornar-se Filósofo. O platonismo reverencia o mundo das Idéias, pois a realidade física, material, sensível, concreta, não alcança o “Ideal” de perfeição que somente a representação mental, abstrata (imaginem a geometria, o lógos) propicia.

Em 337a.C Aristóteles funda o Liceu, dedicado a Apolo (irmão de Athena), divindade olímpica que presidia a harmonia, a música, a saúde e a verdade. Aristóteles distinguir-se-à por propor uma nova forma de apreender e explicar o mundo. Para o pragmático estagirita (Aristóteles nasceu na cidade de Estagira), a lógica e o bom senso dariam conta da realidade captada por nossos sentidos (visão, audição, paladar, olfato, tato). Formulará então, a teoria das quatro causas: Formal, Material, Eficiente e Final. Segundo a obra de Aristóteles “Metafísica” (disponível em português graças a esmerada tradução de Marcelo Perine – PUC-SP), “As duas primeiras não são mais do que a forma e a matéria, que estruturam todas as coisas sensíveis. (Recorde-se que “causa” e “princípio”, para Aristóteles, significam o que funda, o que condiciona, o que estrutura). Mas matéria e forma, sob certo aspecto, bastam para explicar as coisas; sob outro aspecto, porém, não bastam. Se considerarmos o ser das coisas estaticamente, bastam; se, ao contrário, considerarmos as coisas dinamicamente, isto é, em seu desenvolvimento, em seu devir, em seu produzir-se e em seu corromper-se, então não bastam mais. Com efeito, é evidente que, se considerarmos determinado homem estaticamente (ou seja, como ente já perfeitamente realizado), ele se reduz à sua matéria (carne e ossos) e à sua forma (alma); mas se o considerarmos de outro modo e perguntarmos: “como nasceu”, “quem o gerou”, “por que se desenvolve e cresce”, então, impõem-se duas razões ou causas ulteriores: a causa eficiente ou motora, isto é, o pai que o gerou, e a causa final, ou seja, o fim ou o escopo ao qual tende o devir do homem”.

Tomando uma escultura como exemplo, teremos, 1º) a causa material, a substância concreta que compõe um objeto, no caso o bronze; 2º) a causa eficiente, que será o processo que produziu a escultura, nesse caso, o trabalho do artesão 3º) a causa formal, que é a estrutura interna que determina a realidade da escultura e por fim 4º) a causa final que diz respeito a finalidade a escultura foi produzida.

Ele dividiu o mundo em duas instâncias: da lua para baixo (matéria sublunar), tudo era composto pelos intercambiáveis quatro elementos (Fogo, Terra, Água e Ar). Já na esfera da lua para cima (matéria supralunar), toda galáxia era composta por uma substância eterna e imutável, o éter. Filósofo da natureza, esclarece que a labareda do fogo tende a subir, pois é da natureza do fogo ocupar as partes superiores da atmosfera. Já uma pedra, tende a cair porque sua natureza é a mesma da terra. Quanto ao responsável por toda orquestração do universo, o Demiurgo, o Criador (Deus), o “movente imóvel” faz morada numa esfera exterior.

Se com Platão apreendemos a inefável e sublime Idéia do “Bem em si”, com seu pupilo temos a afirmação de que, contrariamente à tese Socrática de que basta conhecer o Bem para desejá-lo; é preciso praticá-lo! E será justamente a prática quem nos dirá o que é o Bem. Para Aristóteles é necessário ainda, a disposição da vontade, do querer, de se desejar praticar o Bem. É o desejo e não a ação que leva ao Bem, e o desejo pode ser educado, virtuoso. Agir bem é equilibrar, em cada caso particular, o excesso e a falta. Para o estagirita, a Justiça é a maior das virtudes! Constitutiva da Paz na sociedade e da felicidade na vida humana sendo, a Igualdade a pedra angular do princípio da Justiça.

Sabemos que a Matéria (ta pragmata) está impregnada do Espírito (ta onta), que se manifesta através de nossos atos. É o magnífico rapsodo grego Hesíodo (600a.C) quem melhor traduz essa dualidade. Em sua obra “Teogonia”, o poeta discorre sobre o nascimento dos deuses. Do “Caos”, que nada tem a ver com desordem e sim, diz respeito à matéria indiferenciada, o não-ser, nascerá a oposição primordial: Urano e Gaia. Simbolizando respectivamente, Espírito e Matéria. Analogamente, Platão versará sobre o “Ideal” e Aristóteles, sobre o “Real”. Tentar hierarquizar qual dessas teorias é mais relevante é tão inútil quanto discutir qual mais importante: o Céu ou a Terra.

Saiba mais:

Aristóteles – Metafísica – Giovanni Reale. Tradução: Marcelo Perine. Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2001.

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